Nessa turbulenta época que estamos atravessando, nada mais confortador do que refletir sobre as palavras daquelas pessoas que trazem para nós mensagens de esperança, de que tudo pode ser redimido e curado. Pessoas raras, espelhos refletores da sabedoria, canais que emanam o bem através da arte.

Sempre que ouço a música Alvorecer, de Dona Ivone Lara e Delcio Carvalho, fico pensando sobre como podemos nos conciliar conosco mesmo, conviver com nossas imperfeições e, apesar delas, seguir em frente, erguido, na certeza de que existe um amanhecer, uma Luz dentro de nós, guiada por uma Inteligência Suprema que aguarda nosso despertar. A estrofe inicial começa assim:

“Olha como a flor se ascende
Quando o dia amanhece
Minha mágoa se esconde
E a esperança aparece
O que me restou da noite
O cansaço e a incerteza
Lá se vão, na beleza, deste lindo alvorecer”

Este poema, profundamente filosófico, simples e sofisticado ao mesmo tempo, traz à mente o simbolismo da flor de lótus, aquela que nasce nos pântanos dos nossos apegos e dificuldades de toda a sorte, contudo, ergue-se sobre a água lodosa em busca da luz. A palavra “ascende” é expressiva porque comunica o sentido da elevação e da sublimação espiritual.

Lembro também do simbolismo do Mito da Caverna, de Platão, quando alguns seres, após um longo período vivendo escravizados pela ilusão imposta pelos detentores do poder, conseguem, finalmente, libertarem-se das grossas correntes das prisões mentais que os mantém na ignorância e, assim como a flor, ascendem em direção à Luz, em busca do ideal do bem. Aqueles que se libertam, ao verem a Luz e as amplas possibilidades de crescimento e elevação que se descortinam à frente deles, por pura compaixão, retornam à caverna para tentar libertar outros prisioneiros da ilusão, do medo e da escravidão mental. Trazem dentro de si a essência do amanhecer, do despertar e da esperança.

“O dia que amanhece” traz a ideia da renovação, forjada pelas dores e pelos problemas da vida, pela vivência das noites escuras da alma, aquelas noites tão bem descritas por São João da Cruz em seus preciosos ensinamentos em forma de versos. As mágoas, ressentimentos, medos, desilusões e todas as não conformidades que trazemos ao longo da nossa trajetória funcionam como veículos de elevação de consciência e parecem que se acalmam diante do amanhecer, diante do brilho da nossa Luz, do ser divino que todos somos em essência.

Amanhecer: o mais antigo sinal de vida sobre a Terra.
Amanhecer: ainda o mais novo sinal de vida sobre a Terra.
Amanhecer e vida humana se entrelaçam na mesma luz
(Carlos Drumond de Andrade)

O “voltar-se para dentro de si mesmo”, como dizem os sábios, filósofos e espiritualistas é uma chave importante no processo de crescimento e de superação das nossas ilusões e da cura dos males causados pelo egoísmo. Para ver o amanhecer luminoso é preciso remover tudo que impede a manifestação da Luz, e essa remoção, penso eu, depende de muito esforço pessoal e, principalmente, da ação da Graça Divina. A medida que aspiramos à elevação, abrimos as portas para que as Luzes do Despertar entrem. Apesar das dificuldades, devemos lembrar que elas são nossas aliadas, impulsionadoras do nosso crescimento como seres humanos.

 “A vida é uma pedra de amolar: desgasta-nos ou afia-nos, conforme o metal de que somos feitos”
(Bernard Shaw)

O amanhecer é como o colo da Mãe Divina, o Manto Protetor que faz a conexão com os atributos da nossa alma, ligados à compaixão, à fraternidade e ao amor. E ai tudo cai de peso, o fardo fica mais leve, o cansaço e a incerteza “lá se vão na beleza deste lindo alvorecer”. Surge a coragem para seguir a vida com alegria e parece que os autores escutaram a voz da iluminada Mirra Alfassa (1878-1983), francesa conhecida como A Mãe, que sintetiza o amanhecer com maestria no livro “A Descoberta Suprema”:

Coragem! Escuta a lição que o sol nascente traz à Terra a cada manhã, com seus primeiros raios. É uma lição de esperança, uma mensagem de consolo. Tu que choras, tu que sofres, tu que tremes sem ousar prever o fim dos seus males, um modo de escapar das suas dores, olha:

não há noite sem aurora, e a alvorada se prepara quando as sombras se adensam;
– não há nevoeiro que o sol não disperse, não há nuvem que ele não torne dourada;
– não há lágrima que não seque um dia; não há tormenta que depois não irradie seu arco triunfal;
– não há neve que o sol não derreta, nem inverno que não se transforme em primavera.

Se a provação ou a falta te jogou no chão, se te afundares em abismos de sofrimento, não te aflijas, porque é então que a divina ternura e a suprema bênção poderão te alcançar! Porque tu passaste pelo crisol das dores purificadoras, a ti, portanto, pertencem as gloriosas ascensões.

E a bela canção continua:

E este mar em revolta que canta na areia
Qual a tristeza que trago e minha alma campeia
Quero solução sim, pois quero cantar
Desfrutar desta alegria

Que só me faz despertar do meu penar

E este canto bonito que vem da alvorada
Não é meu grito aflito pela madrugada
Tudo tão suave, liberdade em cor
O refúgio da alma vencida pelo desamor

Que possamos encontrar o refúgio no nosso interior, extrair das mazelas e das dificuldades o adubo que nos fará crescer em consciência e renascer na bondade e no perdão. Que possamos atravessar essa difícil fase, esse túnel escuro, com uma vela na mão para iluminar também os caminhos daqueles seres carentes de afeto e de uma palavra de consolo. Que possamos irradiar paz e harmonia para todos que se aproximarem de nós. Que possamos simbolizar o amanhecer de um novo dia e trazer esperança aos corações aflitos. Que possamos ser simples e humildes para reconhecer o Poder e a Presença de Deus dentro de nós, para nos guiar e nos tornar cada vez mais íntegros, éticos e livres. Que possamos ser servidores da Luz e realizar na vida aquilo que o Pai idealizou para cada um de nós.

Em que pese todos os ventos da discórdia e do sentimento de lassidão que parece contaminar muitas pessoas, fiquemos com a mensagem de esperança de melhores dias trazida por Nelson Cavaquinho, em Juízo Final, na certeza que o Amor é a cura para todos os males, o Sol que irá erradicar o mal definitivamente.

Que assim seja. Amém!

Juízo Final
O sol há de brilhar mais uma vez
A luz há de chegar aos corações
Do mal será queimada a semente
O amor será eterno novamente

É o juízo final
A história do bem e do mal
Quero ter olhos pra ver
A maldade desaparecer

(Nelson Cavaquinho)

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