Fonte do texto: Como um místico amarra os seus sapatos: o segredo das coisas simples. MARTI, Lorenz. Editora Vozes.

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Era uma vez três irmãos. Um deles decidiu cuidar dos enfermos, o segundo quis dedicar-se à paz, o terceiro foi para o deserto viver como eremita. Passaram-se os anos. Um dia, quando os dois primeiros se encontraram, tiveram de reconhecer que não haviam conseguido preencher as suas expectativas. Desejaram praticar o bem, mas não conseguiram. O mundo não havia se tornado melhor.

Então resolveram procurar o terceiro irmão, que havia ido para o deserto. Este pegou um jarro cheio de água e despejou o líquido lentamente num outro jarro.

– O que vocês estão vendo? – perguntou ele aos outros dois mostrando o jarro.

– Água jorrando – responderam eles.

O eremita colocou o recipiente ao lado, esperou alguns minutos até a água ficar totalmente parada e perguntou novamente:

– O que vocês estão vendo agora?

Os dois olharam para dentro do jarro e responderam:

– Agora estamos nos vendo refletidos na água.

– Então meus irmãos, vocês também precisam atingir a serenidade para se reconhecerem. Só então poderão realmente ajudar os outros.

Essa história era contada entre os monges cristãos que viveram há 1.700 anos como eremitas nos desertos do Alto Egito. Provavelmente, naquela época já existia a tendência de, por excesso de ativismo, passar-se pela vida sem dar atenção a si mesmo. Certamente os dois irmãos tinham intenções nobres, mas faltava-lhes o fundamental para poderem se dedicar aos semelhantes com todas as forças e todo o coração. Conheciam muito pouco a si mesmos. Possivelmente a motivação deles também não era clara. E assim não conseguiram converter as suas boas intenções em boas ações.

O terceiro irmão colocou o espelho diante deles. Olhem-se bem! Saibam claramente quem vocês são, o que querem e porque o querem. Senão vocês fracassarão, consigo mesmos e com os outros.

Quem é que hoje em dia ainda tem tempo para esperar até que a água fique límpida para depois se ver refletido nela? Numa sociedade marcada pela velocidade e pelo consumo rápido há pouco espaço para a auto-reflexão. Os monges do deserto retrucariam dizendo que pouco importa se há muito ou pouco espaço, utilize tudo que estiver à sua disposição para alcançar a serenidade e aprender a se conhecer melhor. E então vá e aja.

Neste caso o autoconhecimento tem um significado bastante prático. Não se trata de se conhecer e se entender intimamente. Isso não é possível. Toda pessoa é e permanece sendo um mistério, mesmo diante de si mesma. Mas é possível aprendermos a conhecer os mecanismos dos nossos pensamentos, sentimentos e comportamentos, para também poder modificá-los, se necessário.

Sob esse aspecto os patriarcas do deserto eram radicais. Abba Agathon dizia que não devíamos nos deixar impressionar por alguém que conseguisse despertar os mortos, mas que não dominava a si mesmo. “Preste atenção em você!”, era o conselho dado nos primeiros séculos nos eremitérios e mosteiros egípcios a muitos buscadores que estavam no caminho. Os velhos monges estavam convencidos: aquele que não se conhece e não presta atenção em si mesmo ignora o essencial.

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Sabiah – Conselheiro Voluntário