Uma breve síntese do livro “15 Dias de oração com São João da Cruz”, de Constant Tonnelier, a qual pode ser útil para estudos e aprofundamentos sobre os temas oração e busca espiritual. Trata-se portanto, de uma leitura que requer silêncio interior para perceber as sutilezas de uma vida orientada pelo espírito. A maioria das citações são transcrições do livro; outras, interpretações.
Como sabemos pelas obras e legado de São João da Cruz (1542-1591), Cristo foi o ponto focal e a inspiração em toda a sua trajetória espiritual. Para ele, a suprema bênção era a união com Deus, condição essencial para expressar a verdadeira humildade, simplicidade e amor ao próximo.
1º. Dia – Desejar conhecer-te para assemelhar-me a Ti
Senhor, permita-nos olhar tudo e todos com seu olhar misericordioso e piedoso. Contemplar a Cristo, observar seu olhar e pedir para que nosso olhar seja como o dele. Aspirar por misericórdia para o nosso senso de reprovação, de crítica, de incompreensão e de sedução.
Pedir a Cristo que nos deixe conhecê-lo, que nos permita ver nossas cegueiras e, assim, nos deixar transfigurar no seu amor. Senhor, reviva em minha alma o desejo de conhecer-te. Revela, Pai, todo seu esplendor. Que eu possa, mesmo que tenuemente, ter uma visão de toda a plenitude da vida.
Pedir piedade para que, através do nosso pequeno olhar, mesmo desfigurado, possamos ter a visão do invisível, do todo, e que este ínfimo vislumbre nos leve a contemplar a beleza oculta por detrás de tudo.
Que em Cristo possamos encontrar coesão e entendimento da nossa vida, e que essa se integre à vida única. Que em Cristo nosso olhar e nossas atitudes se tornem luminosas. Que Nele e por Ele cresça o desejo de melhor conhecê-lo para viver como Ele.
2º. Dia – Deixar-me ferir para te encontrar
Só se ama de verdade quando deixamos que Cristo penetre em nós. Precisamos sair de nós mesmos, de forma a provocar uma brecha, uma ruptura, que libertará nosso coração e nosso ser de todo o desejo de posse.
Muito marcos na nossa vida coloca-nos face a face com o sublime amor de Deus. Qualquer que seja o marco, seja uma ferida, quer uma chaga ou uma agonia, a chave é abrir uma fenda no nosso coração para que o amor de Deus penetre e, assim, nos transformamos e nos curamos.
Deixar-se morrer para si mesmo, como forma de viver para o Senhor e deixar que todo Seu amor de fogo invada nosso coração. Deixar-se transformar pela agonia da alma, que é uma fenda por onde Deus penetra e transforma nosso cotidiano em vida de amor. A agonia é sempre dolorosa, mas é ela que conduz, na hora inesperada, a alegria de viver e sentir o amor de Deus em nós.
É preciso estar aberto para perceber o toque divino em nós. Temos que ter sede de amar e de nos deixar amar. Temos que procurar Deus, sermos humildes e pobres (depegado de tudo), como forma de deixar-nos levar e nos elevar no Seu amor.
Encontrar a fonte de amor, em Cristo, não significa nos desocuparmos das ocupações da terra, do peso do labor humano; contudo se em nós corre a fonte do amor divino, tudo o que é humano muda de sentido e numerosas indagações encontram respostas.
3º. Dia – Consumido pelo desejo da tua presença.
Deixe-se habitar pelo desejo profundo da presença do Senhor, que supera qualquer outro desejo, até que a seguinte oração possa ser dita da forma mais pura possível: “Senhor, o teu nome e a lembrança de ti resumem todo o desejo da minha alma. A minha alma suspira por ti dia e noite; sim, no meu íntimo, o meu espírito te busca”.
Este desejo não nasce de nós, nem das nossas aspirações, mas é um dom de Deus e devemos invocá-lo sempre, pedindo Graça, sabendo que será ouvido por Ele: “Vós me invocareis, vireis e rezareis a mim, e eu vos escutarei. Vós me procurareis e me encontrareis, porque me procurareis de todo o coração; e eu me deixarei encontrar por vós”.
Buscar com ardor o encontro com Deus, porque é isso que nos libera das penas e das angústias. Se deixarmos que Ele nos invada, o Amor nascerá em nós e nossa vida se transfigurará. Desejar essa presença nas profundezas do coração.
Pedir ao Senhor para mantermos a chama viva da aspiração em contemplá-lo, sabendo que somente Ele é capaz de satisfazer a vontade de viver na Sua presença. “Só tu Senhor é capaz de satisfazer o desejo que tenho de ti e, com os olhos da minha alma, permita que eu O veja face a face”.
Que Tua luz penetre, expulsando as trevas que estão em mim e ao meu redor. Cristo, põe em minha mão a chama da comunhão Contigo, para que eu avance para Ti. Luz da fé que ilumina a inteligência; Luz da esperança que fortalece a vontade; Luz da caridade que conquista o coração.
4º. Dia – Ferido, pertenço totalmente a ti?
Nosso coração deve ser totalmente entregue a Deus e ”roubado” por Ele. Temos que ter ânsia de amor por Deus e não gostar ou desejar outra coisa senão Dele.
A alma deve estar como um recipiente vazio, a espera de ser preenchida pelo amor de Deus. Devemos invocar isso, sabendo que todo o amor humano será desdobrado em amor de Deus.
Deus deve ocupar tudo em nossa vida; tudo aquilo que somos, fazemos e sentimos deve ser convergido para Ele. Ele ocupa o primeiro lugar e não nosso pequeno eu. O pensamento deve estar invadido pela presença do Amado, que reflete um amor desinteressado, desimpedido do eu, um amor puro, límpido, que não busca satisfação própria, sua alegria própria e seu interesse.
Esse poder do amor de Deus agindo em nós é capaz de fazer muito além, infinitamente além de tudo que possamos pedir ou conceber. Não há, portanto, limites em nosso caminhar humano, pois quando estamos liberados de nós mesmos abrimos espaço para que Ele ocupe tudo o que estiver desocupado.
Mais há dias de aridez, quando a ferida se torna viva em nosso coração, porque o silêncio do Amado nos deixa famintos do seu amor, vazio da Sua presença, doente de amar e sem repouso diante de Vós. “Estes são momentos que nos convidam a dizer: De fato, Senhor, pertenço a ti, somente a ti”.
5º. Dia – Descobrir quem tu és, ó Cristo, para tornar-me teu.
Toda luz vem do alto; se a acolhermos, descobriremos a entrada da caverna, penetrar nela, viajar por ela, ir sempre mais longe e mais fundo, sem nos perdermos. O simbolismo da caverna é Cristo, que nos convida a penetrar os seus mistérios e descobrir os tesouros de sabedoria.
Não se penetra os mistérios de Cristo de uma vez. É preciso escavar fundo e afastar todos os obstáculos que nos impedem de encontrá-lo. “Senhor, permita-me ver o que é preciso fazer; depois insufla em mim a coragem para realizá-lo”.
Eis que entro na caverna e tenho na mão a lâmpada do espírito, a qual dirijo em todas as direções. Quanto esplendor! Quantos mistérios, muito acima das minhas possibilidades. Meu grito de admiração e de contemplação só pode ser o Teu e tomo-o emprestado de Ti: “Eu te bendigo Pai, Senhor do céu e da terra, porque escondeste estas coisas aos sábios e entendidos e revelaste aos pequeninos”.
Nas nossas relações, no viver junto com os outros, cada um deixa transparecer aquilo que permitirmos experenciar de Ti. O que vivemos de Ti, vibramos em nós mesmos. Devemos dar graças por estar ao lado daqueles que transmitem e vivem uma centelha do Teu mistério.
Mas para te amar, terei de passar pelo caminho estreito do sofrimento, a rejeitar tudo o que não És, a abandonar todas as ideias e falsas sabedorias, de forma a alcançar a única sabedoria, que és Tu. Mesmo aquilo que nesta vida podemos conhecer dos mistérios de Cristo, não nos é dado alcançar senão depois de muito sofrimento.
“Purifica, Pai, todo o meu ser no olhar e na escuta, desapega meu coração de todas as suas incapacidades de amar. Dá-me a oportunidade de ir até o Invisível pelo dom da fé. Mergulha-me em Ti. Esconde-me em Ti”.
6º. Dia – Como posso tornar-me semelhante a ti?
A chave é integrar a vontade de Deus com a nossa vontade. “Meu Pai o amará e viremos a Ele e faremos Nele a nossa morada.” As transformações em nós e a expressão do verdadeiro amor decorrem desta oferta por realizar sempre a vontade do Pai Único.
Mas o amor tem que ser vivido e praticado. O amor cresce, desenvolve-se, progride sempre. Desconfiemos do amor que dá sem dar-se, de uma vontade que se oferece sem se entregar totalmente, de uma liberdade que se afirma, mas sem se construir plenamente.
Devemos ser como um vidro limpo para refletir efetivamente a pureza da Luz Divina. Nossos vidros não podem ser obscurecidos pela tibieza, pela falta de generosidade e pela indolência. Amar mais ou menos não é amar e nossos vidros não devem ter manchas de espécie alguma, pois, por menor que sejam, acabam maculando o verdadeiro amor.
Nossa vida deve revelar toda a grandeza, pureza e potência do amor de Deus. A integração das vontades permite isso. Todo o nosso ser, como uma vidraça limpa, recebe a luz e a devolve como um sinal luminoso, como se o vidro tivesse desaparecido; no entanto, o vidro permanece como um sinal que atrai o amor. Ele devolve Deus a Deus.
7º. Dia – Para ti com toda a força de minha vontade
Por mais virtudes que a alma possua, nunca chegará ao estado de união com Deus se não subordinar totalmente sua vontade a vontade Dele. Não poderá haver por parte da alma qualquer apetite voluntário, por mínimo que seja. Pouco importa se o pássaro está amarrado por um fio tênue ou grosso, tão preso estará por um como pelo outro.
Esta comunhão de vontades requer muitas purificações, mas isso não nos deve desanimar nem nos causar medos. Deve ser encarado como um encorajamento, um desafio que nos lança sempre para frente, para o alto, para o futuro, esquecendo o que fica para trás.
Se pensarmos que não vamos conseguir, considerar que não estamos sós: “Permanecei em mim, como eu em vós. Permanecei no meu amor”. Ficar atento e vigilante ao menor desejo, pois estes acabam se tornando um obstáculo à união com a vontade de Deus. Mais não devemos desanimar em momento algum, pois contamos com a misericórdia e com o amor de Cristo. Ele restaura tudo em nós.
O desejo simples em querer a purificação para vivenciar plenamente o amor já é amar e estar certo de ser amado por Deus.
8º. Dia – Meu caminho só pode ser o teu
Para seguir o caminho Crístico devemos matar e aniquilar todas as nossas vontades referentes às questões de ordem temporal, pessoal e espiritual. Este sentido de negação se alicerça no dizer de Cristo: “quem quiser salvar sua alma, esse a perderá” ou, em outro sentido, “quem perder sua alma por Mim, a ganhará”.
A condição de acesso para seguir o caminho de Cristo: “perder para ganhar”. Ou seja, perder-se a si mesmo, não buscar nem possuir nada para si mesmo, nem tampouco buscar as doçuras e as facilidades da vida. Assumir tudo na humildade e no desapego, como se nada possuísse, tendo uma atitude de completo desprendimento de tudo.
Temos que percorrer a estrada real da cruz de Cristo, carregando-a dia a dia. Devemos imitar Cristo. Neste caminhar, vamos encontrar situações de abandono, de completo deserto, de aflição, de secura interior; uma noite escura. Mas todas estas provações são vencidas se persistirmos no caminho, com fé, sabendo que se trata de importante etapa do processo evolutivo.
A cruz é a maior obra de Cristo e deve ser lida como fonte de puro amor, como um sinal de Deus, que salva, eleva e purifica o homem. A cruz é fonte de graça e caminho de união e comunhão do homem com o Pai Único.
“Se o grão de trigo que cai na terra não morrer, permanece só; mas se morrer, produzirá muito fruto”. Na cruz, Cristo viveu esta morte, na solidão e no completo abandono, contudo produziu frutos abundantes para toda a humanidade.
A cruz de Cristo ilumina nossas cruzes. Ela é uma prova suprema de um amor salvador e redentor. “Que vos baste o Cristo crucificado; com Ele sofrei e descansai”. Se nas pesadas provas da vida ocorrer desânimo e cansaço, busque o repouso junto de Jesus, pois Ele o aliviará e fortalecerá a vontade vacilante e iluminará as escolhas. Mas não nos iludamos, “se quiserdes possuir Cristo, não o busqueis nunca sem a cruz”.
9º. Dia – Purifica a minha inteligência.
Não é através da inteligência que se chega a Deus, mas pela alma purificada, despojada, pura e simples. Toda esta purificação passa pela desconstrução de ideias fixas, de estruturas mentais arraigadas, de mecanismos mentais que sugerem o caminho para a Luz. Devemos ser simples, desapegados de deduções sutis do saber e da discussão, sem as hábeis argúcias da dialética.
Mas como unir os dois extremos: Tú, Senhor, a divina sabedoria, e eu, um ser limitado e finito? A união não é pelo intelecto, mas pela fé. A fé que promove total confiança no Deus que se revela, que diz o sim fiel de um coração que ama, na esperança de fazer, completamente, a sua descoberta de Deus.
“Mais se aproxima a alma de Deus não entendendo do que entendendo”. A não compreensão estimula a fé e leva ao despojamento de todas as certezas construídas para se chegar a uma ideia de Deus.
“Quem pratica a verdade vem à luz”. Senhor, dá-me essa coragem de praticar a verdade em mim, de me despojar de um saber que pretenderia encerrar-te nas minhas construções intelectuais. Abra-me à tua verdade, de onde jorrará para mim a luz da fé, o sim ao que Tu és, no íntimo do meu ser.
Somente aqueles que se abandonam a Ti, na fé, chegam ao invisível. É sob as trevas da fé que o entendimento e a inteligência se unem a Deus. Crer sem ver e, no entanto, levar em si uma luz que não se apaga.
10º. Dia – Cristo, no caminho tu és o meu único apoio
Só em Cristo encontraremos remédios para nossas ignorâncias e fraquezas espirituais. Todo o conhecimento sobre Cristo vem Dele. “Abra meu ouvido Pai para que ao despertar eu ouça o seu chamado para amar, para que ouça o que me revelas, para que responda ao que esperas de mim”.
Temos que acolher a palavra Cristo em nossas vidas, na fé, sabendo que esta palavra não é exterior a nós, mas habita em nós. No eterno silêncio podemos perceber este som “Cristo”, que sai da “boca de Deus”, o qual se espalha como círculos concêntricos no lago, cuja vibração chega a todos os que estejam sintonizados com Ele. É no silêncio que a alma ouve este som, quando cessarem os ruídos interiores e exteriores e também quando a vontade pessoal, nossa inteligência, nossa memória e todos os nossos sentidos forem purificados.
A cruz é a nossa resposta para os momentos de dor, de busca e de consolação. Ela simboliza o amor, pois Cristo se entregou na cruz por puro amor. Portanto, de uma situação sem sentido, como todos os nossos sofrimentos, nasce um comportamento novo e um sentido novo, alicerçados no amor.
Para entendermos a vida e descobrir o sentido oculto de tudo, ponha os olhos em Cristo e observe os mistérios da vida Dele, do presépio à crucificação. Temos que nos deixar instruir como discípulos para aprender a sabedoria e as maravilhas de Deus, sabendo que a verdadeira ciência é conhecer, com o coração, a Jesus crucificado.
“Ponde vossa confiança no Senhor para todo o sempre, porque o Senhor é uma rocha eterna”.
11º. Dia – Esvaziar-me de tudo para me aproximar de ti
Para avançar no caminho nossa memória deve estar unida à memória de Deus; sem isso, andaremos nas trevas, sem clarão algum. Nossa mente deve esvaziar-se de toda necessidade, de todos os esquemas habituais. Portanto, a chave é o silêncio profundo.
Sente no silêncio e faça uma longa pausa para interromper tudo o que te persegue, tudo o que te preocupa. Silenciar, não para te inebriar de lembranças, nem para gaguejar palavras impotentes; fique em silêncio sem palavras, sem lembranças e sem evocações de espécie alguma. Fechado na sombra, com os olhos fechados, a imaginação dominada, o coração em expectativas de amor para receber Deus, a dar de Deus.
No silêncio, todo o ser deve estar despossuído de si mesmo para estar inteiramente na expectativa de Ti, Senhor. Neste profundo silêncio, totalmente disponível, aprenderei algo Dele. Temos que estar vazios de todo o criado para acolher a plenitude incriada, cuja presença penetrante transfigurará nosso olhar sobre as pessoas e sobre as coisas.
Quanto mais me torno um ser silencioso, mais me liberto de todos os conhecimentos e construções de minha inteligência, mais me esvazio e me despojo de toda imagem, de toda imaginação, de toda ilusão, mais minha memória se une a Deus. Assim, permitimos ser invadidos pelo amor de Cristo, que penetra em nós seu poder de amor, fazendo com que nos tornemos aptos a nos dar cada vez mais e, deste modo, ficamos mais desejosos de nos entregarmos ao Seu amor.
Este estado de vazio de nos mesmos, com sede da plenitude de Deus, não pode ser atingido somente pela nossa força, pela nossa vontade, nem pelo nosso desejo. Este estado só pode vir do Senhor, que precisa encontrar um ser desapossado para consumar Sua obra. Devemos esperar no silêncio a Graça Divina se manifestar para finalmente estabelecermos a união com o Pai.
No completo vazio e no tempo certo, farás sentir Tua ação em mim; como e quando Tu quiseres, e nunca cessar de esperar. Sim, espero a hora em que receberei a Graça, em que Tu te aproximarás de mim para tornar-me em Ti.
12º. Dia – Purificado, eu repouso em ti
A purificação tratada nesta etapa se refere ao Matrimônio Superior, entre a alma e o Senhor. Trata-se da comunhão verdadeira, onde o Senhor chama qualquer um que se deixa seduzir por Ele: “Eu te desposarei para sempre … no amor e na ternura. Eu te desposarei a mim na fidelidade e conhecerás o Senhor”
Cabe a nós ouvir esta voz nas profundezas, de forma a abrir a porta do nosso coração ao Deus que está muito perto e pede para entrar. “Entrarei em sua casa e, juntos, faremos a refeição”.
Lembrar sempre que só Deus opera na alma. Matrimônio espiritual que não está reservado aos sábios, aos entendidos, aos poderosos do saber, mas ao qual Ele convida qualquer um que tenha sede de uma plenitude de amor e se deixa pegar e transformar por Ele em capacidade de amar. Este matrimônio brota, simultaneamente, do coração de Deus e do nosso, porque Ele nos penetrou com Seu amor.
Embora dependa de Deus, nossa capacidade de acolhida, de amar e nossa generosidade no amor são determinantes para a união com Ele e para adquirimos proteção contra o inimigo, aquele que semeia a desunião. “O demônio teme uma alma entregue a Deus como ao próprio Deus”
Por outro lado, Deus nos quer na dependência generosa do amor, no despojamento radical de nós mesmos, num nada que se torna tudo. “Ó feliz nada! Feliz segredo do coração, que tem todo o poder de sujeitar todas as coisas e a nada querer sujeitar-se … a fim de arder de um mais ardente amor”. Basta-nos ser amados, arrastados no amor, conduzidos até onde somos capazes de amar nesta vida.
13º. Dia – Meu olhar se tornou o teu
Teus olhos Senhor gravam em mim todas as coisas, não as deste mundo, mas as que habitam em Ti nas profundezas do teu ser. Gravas em mim uma parte de Ti mesmo, a qual sou capaz de acolher. Tu me tornas capaz de ler em Ti e, portanto, de poder adorar o que em Ti meus olhos veem e descobrem.
O meu olhar tornou-se o Teu olhar, numa comunidade de vida e de amor que quiseste ter comigo. Devolvo ao Senhor todo o amor que Ele me manifesta, depois de tê-lo acolhido em minha vida, de sorte que voltando a Ele, seja todo cheio de uma vida entregue por amor, de uma vida transformada por amor, de uma vida que aspira apenas a dar-se sempre mais, um coração plenamente invadido pelo Deus de amor.
Há dias em que transbordo de amor, em que o amor por Ti é tão forte em mim que creio que tudo é possível, mas vindo de Ti e não de mim. Desde a cruz, o amor não cessa de ser derramado para todos. Pai, me inundas sempre com Teu amor, me elevas a Ti para fazer-me sempre mais teu. Nesta comunhão aprenderei progressivamente a amar à Tua maneira.
Se tu não estás comigo, cumulando-me com Teu amor, sei que não sou capaz, pois ficarei no nível humano, das pessoas e das coisas, nelas amando a mim e não a Ti. Só Tu és capaz de unificar meu ser, fazendo com que eu ame tudo, mas em Ti. Meu olhar tornou-se Teu e meu coração compreendeu que o amor chama o amor.
14º. Dia – Teu amor me leva sempre mais longe
Deus é o centro da nossa vida. Ele nos atrai para mergulharmos no Seu abismo de amor. Nossa caminhada para Ele pede, pois, que vivamos totalmente centrados Nele com toda capacidade do nosso ser, não importa o que estejamos fazendo. Tudo em mim é para Ele, quando Ele for tudo, absolutamente tudo, para nós.
Assim, iremos caminhando até o cume da montanha, um cume sempre a alcançar, onde Deus me aguarda para o face a face do amor eterno. Trata-se de um ponto a atingir pelos lances em espiral, que progressivamente me libertam do ambiente humano para aproximar-se da luz de Deus.
Neste mundo, devemos saber que Deus é o centro da nossa vida, cume para o qual todos nós iremos. Como o caminhar é infinito, o conhecimento de Deus também o é, portanto, nunca chegaremos no cume do amor. Como não estamos no nosso centro mais profundo, devemos aspirar sempre a crescer no conhecimento e no amor.
Quanto mais puro for o cristal, tanto mais capta a luz e a transmite. Sem luz, ele permanece cristal, mas não dá sua riqueza. O mesmo acontece conosco. Sem Deus, não transmitimos nada de nós. Mas, no reflexo do amor de Deus que chega a nós, nos transformamos em claridade total, completamente brilhante de seu próprio amor, tornando-nos semelhante à luz, sem, no entanto, jamais nos confundirmos com ela.
Amor transformador de Deus, tu me levarás sempre mais longe, de modo que “cada um vive no outro, sendo um e outro, entre si, um só, por essa mesma transformação de amor”.
15º. Dia – Transformado em Deus, encontro minha verdadeira imagem
Quando o espírito penetra em nós, somos como um verdadeiro cristal que recebe a luz e brilha com todas as suas cores. Neste estado, as impurezas terrenas que trazemos são arrancadas, nos tornamos aptos a não guardar nada do que somos, do que temos, ficamos totalmente disponíveis à aspiração de amor do Espírito, brisa suave que nos leva em seu sopro de comunhão e de amor e nos faz renascer quando tivermos a alma muito semelhante a Deus em pureza.
Quando a alma se une a Deus, tudo em nós é transfigurado e também ao nosso redor. Nosso dia a dia se transforma e a solidão diante de Deus faz com que nosso olhar sobre o mundo se transforme totalmente, em olhar de amor e de louvor. O coração fica radiante de paz e ultrapassamos e superamos as provações da vida.
“Faze com que eu progrida no caminho da terra, Senhor, até a perfeita união contigo, quando chegarei ao teu reino de Glória. Guarda-me na brisa de teu espírito para que meu coração permaneça sempre em capacidade de te amar”.
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